246 anos da Polícia Militar de Minas Gerais
Fonte: Marcos Valério Ferreira
Imagem de quase 100 anos da Polícia Militar de Itajubá-MG. Foto tirada na rua nova, onde ficava o quartel.
A Polícia Militar de Minas Gerais nesta quarta-feira, dia 9 de junho, comemora 246 anos e o Jornal o Aperitivo tem a honra de homenagear os militares que fazem da Polícia Militar um dos maiores patrimônios da sociedade mineira e parabeniza a todos os militares que ao longo desses 246 anos, ajudaram a construir a nossa história e vem zelando pela segurança de todos.
Origem em 9 de junho de 1775
História e atuação da Polícia Militar de Minas Gerais
Nesses anos a corporação passou por importantes mudanças e também fez parte de momentos históricos de Minas e do Brasil.
O papel dessa instituição na sociedade e na política de Minas é o tema da entrevista da jornalista Vivian Menezes com o historiador e major da PMMG Frances Albert Cotta. Ele conta a história da criação da força ainda no século XVIII e afirma que a Polícia Militar de Minas foi a primeira a ser constituída no Brasil, antes inclusive do Rio de Janeiro. Cotta fala sobre a participação da Polícia Militar de Minas nas Revoluções de 1930 e de 1932, quando a corporação colaborou para que Getúlio Vargas tomasse o poder no Brasil, e aponta os impactos dessas batalhas na constituição da tropa. O major analisa os impactos da Constituição de 1988 na formação dos policiais mineiros e aponta como a Carta trouxe a sociedade para a discussão de assuntos de segurança pública. Frances Albert Cotta comenta sobre a desigualdade entre ricos e pobres nessa articulação com as polícias a respeito dos temas de segurança pública. O historiador fala sobre o papel da greve da PMMG de 1997 na história da corporação e das limitações impostas aos militares pelos regulamentos. O major comenta, ainda, o papel do militar em 2021, a relação dele como o poder e a projeção para o futuro da atuação dos policiais. Major Francis Albert Cotta, policial militar e historiador.
Fonte do vídeo: TV Assembleia
Breve evolução histórica da polícia militar de Minas Gerais (PMMG) e os novos paradigmas da Constituição da República Federativa do Brasil de 1988
Nas terras de Minas do século XVIII deparamos com características especiais devido a situações geopolíticas sui generis. Por isso, os corpos militares havia de ser imbuídos em garantir a arrecadação dos tributos da coroa portuguesa; reprimirem o contrabando do ouro e do diamante; vigilância das estradas, caminhos e rios; além de combater a violência entres as pessoas.
Devido a essas peculiaridades, foram enviados para as recentes terras descoberta de extração de riquezas minerais, a qual mais tarde seria conhecida como Minas Gerais, os Dragões Del Rey (corpo militar português). Por solicitação do Conde Assumar, governador das Minas, os Dragões deslocaram para as terras mineiras com a missão de “guarda aos governadores, ao comboio da Fazenda de sua Majestade e ao socorro contra os poderosos, que se faziam fortes com seus escravos”. (COTTA, 2014, p. 69)
Os Dragões Del Rey, por ter um contingente pequeno diante da demanda daquela época e, principalmente, pela eclosão de diversas revoltas, somando-se a isso o envolvimento dos dragões com o contrabando do ouro e diamantes, tornaram-se uma força incapaz de defender os interesses da coroa naquela região.
Diante dessa situação, como parte da reestruturação militar das Minas sob administração do governador Dom Antônio de Noronha, surgiu no ano de 1775 o Regimento Regular de Cavalaria de Minas, sendo seu corpo policial formados por pessoas com fortes ligações com as Minas. “Os oficiais e soldados do RRCM¹ teriam fortes laços com as Minas. Eles estariam inseridos em redes de parentesco, amizade e compadrio.” (COTTA, 2014, p. 93)
Os seus participantes, ainda no século XVIII, envolveram nos principais eventos de interesses locais, em muitas vezes contrários aos interesses da coroa portuguesa, demonstrando ser uma polícia com ambições mineiras, ou seja, com assuntos das minas e seu desenvolvimento. Neste sentido, Francis Albert Cotta retrata que:
A ideia do mito fundacional da Polícia de Minas aparece na narrativa da criação do Regimento Regular da Cavalaria de Minas (1775), e em especial no destaque dado à presença do alferes Joaquim José da Silva Xavier, o Tiradentes, em seus quadros.(COTTA, 2014, p. 13)
O historiador COTTA (2014) também cita os interesses do Regimento Regular de Cavalaria de Minas em contraposição aos interesses de Portugal, fazendo que este interviesse no regimento militar mineiro.
...nada mais representativo do que o Regimento de Cavalaria. Ele atrela-se diretamente à história da Inconfidência Mineira, uma vez que seu comandante e diversos oficiais e praças participaram do movimento conspiratório contra a Coroa portuguesa no século XVIII. À época dos acontecimentos, o regimento foi colocado sob suspeita, sendo as Minas Gerais policiadas pelos regimentos portugueses de infantaria de Moura e Bragança, que estava estacionados no Rio de Janeiro em função das guerras contra os espanhóis no sul do Brasil. (COTTA, 2014, p. 14)
A recém formada força militar das Minas tinha por natureza a proteção do território e da pátria, também tinha a natureza policial de prevenção e repressão de crimes, mantendo a população em ordem para que o ouro fosse extraído e exportado em favor do Reino de Portugal. Fatos que podem ser percebidos no texto sobre a história da Polícia Militar de Minas exposto do site da PMMG, onde existe o relato da seguinte passagem histórica:
Assim, com a finalidade de impedir a sonegação de impostos e a institucionalização da violência, bem como erradicar o clima de agitação ora instalado na Capitania, o Governador Pedro Miguel de Almeida - o Conde de Assumar - recorre ao Rei de Portugal, que envia a Minas Gerais duas Companhias de Dragões, constituídas somente de portugueses, que tão logo aqui chegaram foram contaminados pelo sonho da riqueza fácil, trocando suas armas pelas bateias e almocafre. Diante do enfraquecimento das Companhias de Dragões e de seu desempenho insatisfatório, o Governador de Minas Gerais - Dom Antônio de Noronha - extinguiu-a, criando, no dia 09 de junho de 1775, o Regimento Regular de Cavalaria de Minas, em cujas fileiras foram alistados somente mineiros, que receberiam seus vencimentos dos cofres da Capitania. (www.policiamilitar.mg.gov.br)
Já no século XIX, deparamos com a Polícia Mineira com a denominação de Corpo Policial de Minas. O grande marco desta época transpassa com a participação da tropa de Minas, ao lado de outras do Império, na Guerra do Paraguai, como bem citou o historiador Francis Albert Cota:
Em 1865, a tropa de Minas, ao lado das suas co-irmãs do Império Brasileiro, tomou parte na Guerra do Paraguai, com a denominação de Brigada Mineira; partiu no dia 10 de maio de 1865. Enfrentando a Retirada da laguna, os mineiros, com minguado remanescente, sobreviveram à dramática travessia de Chaco e ainda se recompuseram e tomaram parte na queda de Assunção. (COTTA, 2014, p. 116)
A Polícia Militar de Minas após a Proclamação da República
Depois da Proclamação da República deparamos com a Polícia Militar de Minas Gerais intitulada de Força Pública dividida em corpos alocados nas principais cidades mineiras (Ouro Preto, Uberaba, Juiz de Fora e Diamantina). “A força foi denominada Corpos Militares de Polícia de Minas, tendo comandos independentes, ficaria sob as ordens imediatas do Presidente do Estado e subordinada ao Chefe de Polícia.” (COTTA, 2014, p. 122)
Sendo assim, o consultor legislativo Fernando Carlos Wanderley Rocha (2014) relata a seguinte situação das polícias com o surgimento da República:
Com a Proclamação da República, as antigas Províncias, agora Estados, passaram a dispor de maior autonomia política, inclusive para organizar as suas polícias, até porque era deles, nos termos do Decreto nº 1, de 15 de novembro de 1889, a responsabilidade primeira para reprimir as desordens e assegurar a paz e a tranquilidade públicas, pelos seus próprios meios, podendo, inclusive, criar Guardas Cívicas, de natureza militar. (ROCHA, 2014, p. 9)
Nesse ínterim, ocorreram os movimentos armados das décadas de 1920 e 1930 em que tiveram a participação da Força Pública de Minas em combate aos revolucionários. A título de exemplo tivemos a Polícia Mineira combatendo o movimento tenentista de 1924 e lutando na Revolução Constitucionalista de 1932.
Da proclamação da República até meados da década de 1940, tem-se uma Polícia Militar com características de aquartelamento como força reserva do exército. Na década de 1940 surge a força policial militar com a finalidade de auxiliar o serviço da polícia civil, conforme explica o historiador Francis Albert Cotta:
A Força Policial, sob a chefia do Comandante-geral, auxiliava a Polícia Civil em suas missões, além de como reserva do Exército Brasileiro, auxiliar a este na “defesa da honra, da integridade e da soberania da Nação contra agressões externas, bem como garantir as instituições, a ordem e a segurança interna”. (COTTA, 2014, p. 175)
Finalmente, em 22 de julho de 1955 cria-se a Companhia de Policiamento Ostensivo, que marca a saída dos quartéis e o surgimento do policiamento ostensivo em Belo Horizonte e posteriormente estende para outras cidades de Minas. “No policiamento ostensivo, era observadas as leis, regulamentos e instruções que regiam os serviços policiais no Estado.” (COTTA, 2014, p.186)
O modelo escolhido para o policiamento dos logradouros públicos das principais cidades mineiras foi as duplas de policiais, semelhante ao modelo adotado na capital do Brasil, Rio de Janeiro, a qual tinha o policiamento ostensivo das duplas de policiais denominados “Cosme e Damião”.
Dando continuidade ao processo de institucionalização do policiamento ostensivo, foi aberto um concurso para que a comunidade escolhesse um nome para a dupla de policiais, modelo eleito para dinâmica de policiamento. Na então Capital do Brasil, Rio de Janeiro, a dupla era conhecida como “Cosme e Damião”. Os belorizontinos fizeram várias sugestões, sendo escolhida a denominação: “Castor e Pólux”. (COTTA, 2014, p. 190)
Neste momento da história da Polícia Militar de Minas é marcado por uma transformação nas ações polícias, pois, ao sair dos quartéis a Polícia Militar iniciaria o serviço policial com respeito aos direitos dos cidadãos, influenciada pela Declaração Universal dos Direitos Humanos e pelos efeitos trágicos da 2º Guerra Mundial e do fim da Ditadura Varguista. Assim, Francis Albert Cotta faz o seguinte comentário sobre a década de 1950:
Partindo-se da premissa de que a década de 1950 representou aos brasileiros um momento de redemocratização, com o fim da ditadura do Estado Novo (1937-1945) e a morte daquele que personificou tal situação – Getúlio Vargas (1883-1954) – torna-se mais fácil entender como a sociedade interferiu na reconstituição de sua força pública. Não lhe interessava mais ter um exército estadual, uma força guerreira a serviço do Estado; novas demandas se colocavam para uma sociedade que respirava ares de democracia. Nota-se uma verdadeira metaformose, certamente incompleta em virtude da eclosão do Movimento de 1964, dos batalhões de infantaria para unidades policiais, que ocorreria logo nos primeiros anos do período seguinte à década de polícia redemocratizada. (COTTA, 2014, p. 203)
Nota-se que a Polícia Militar no policiamento ostensivo atendia aos anseios da sociedade, sendo fruto do desejo dos próprios cidadãos, os quais visavam uma força policial treinada para o controle da violência e manutenção da tranqüilidade pública; designada para respeitar e proteger os direitos da pessoa humana. A força policial existente respondia as necessidades da sociedade recém redemocratizadas, como bem expressou o autor acima.
A Polícia Militar mineira, nessa época, era formada por membros da sociedade destacados para o policiamento ostensivo para garantir os direitos das pessoas, agindo com urbanidade e humanidade. “A Polícia Militar é formada por parcelas do próprio povo destacadas para o policiamento ostensivo fardado e armado, mantendo a ordem pública, preservando a segurança dos seus moradores e defendendo o território.” (ROCHA, 2014, p. 40)
A Polícia Militar Mineira durante a Ditadura Militar
Com a chegada dos militares das forças armadas ao poder político no país em 1964, deparamos com a Polícia Militar de Minas Gerais tendo a responsabilidade de manutenção da ordem pública e exclusividade no planejamento e execução do policiamento ostensivo, conforme previa o decreto-lei 667 de 1969.
Na intenção dos responsáveis pelo golpe, visava-se o controle das polícias militares pelo Exército. “Na ótica dos militares e civis que tramaram o golpe, o controle das polícias militares era uma necessidade.”(COTTA, 2014, p. 212)
Nesse sentido, “a Polícia Militar seria responsável, com exclusividade, pelo policiamento ostensivo fardado e realizaria ações preventivas e repressivas. A Polícia Civil ficaria com atribuições relativas a investigações, atividades cartoriais e burocráticas.” (COTTA, 2014, p. 212)
O historiador Francis Albert Cotta (2014) cita também que durante o governo dos militares, as polícias militares foram atreladas a Ideologia de Segurança Nacional e controladas pela Inspetoria Geral das Polícias Militares. Era necessário controlar não somente a população, mas também as polícias militares.
Em nome da segurança nacional a Polícia Militar de Minas foi à primeira força policial dos Estados a combater as guerrilhas, as quais se tornariam frequentes nas décadas que se seguem o golpe. A resistência armada contra a tomada do poder pelos militares foi iniciada nas terras de Minas, mais precisamente na Serra do Caparaó, onde teve a efetiva participação da Polícia Militar de Minas Gerais junto com o Exército Brasileiro, os quais derrotaram os guerrilheiros.
A região, cujas escarpas de difícil acesso seriam palco das ações entre guerrilheiros e forças policiais e militares, abrangia as cidades de Caparaó Velho, Caparaó novo e Espera Feliz, no estado de Minas Gerais, e Santa Marta, São José, Cruzeiro e Pequiá no estado do Espírito Santo. (COTTA, 2014, p. 207)
Posteriormente, outras guerrilhas surgiram pelo país, a exemplo da Guerrilha do Araguaia; em seguida as guerrilhas se tornaram urbanas como o Movimento 8 de Outubro e outras organizações. A Polícia Militar mineira, assim como as demais polícias militares de outros Estados, combateu os movimentos contrários ao golpe militar conforme a Ideologia da Segurança Nacional determinava. Neste sentido as instruções das policias militares eram impostas pelo Exército, através da Inspetoria Geral das Polícias Militares.
Na operacionalidade do seu projeto de controle das forças policiais dos estados, o Exército instituiu a Inspetoria Geral das Polícias Militares (IGPM), órgão do Estado-Maior do Exército com competência para dirigir diretamente as polícias militares. Todavia, até início da década de 1980, o treinamento dos policiais militares era baseado em manuais do Exército, não possuindo especificidades policiais. (COTTA, 2014, p. 212)
Um marco significante da Polícia Militar de Minas neste período da ditadura militar vem do decreto 21.336/1981, o qual instituiu a Companhia de Polícia Feminina, criada com a finalidade de policiamento ostensivo para atendimento a mulheres, crianças e idosos.
Nas atividades cotidianas do policiamento ostensivo, verificavam-se acentuadas dificuldades no trato com menores em conflito com a lei ou abandonados e com mulheres envolvidas em ilícitos penais. Para atender a esse campo de atividade policial, seria possível dotar as polícias militares de Polícia Feminina. (COTTA, 2014, p. 216)
Igualmente importante foi a distribuição de radiopatrulhas por toda a capital a partir do ano de 1972, contribuindo de forma significante para a diminuição dos índices criminais. Teve também o surgimento da grande inovação tecnológica da época, o centro de operações policiais militares (COPOM), sistema de comunicação que passou a operar no ano de 1974, recebendo chamadas via telefone 190, e repassando para as viaturas de radiopatrulha. Atendendo as solicitações dos cidadãos e diminuindo o tempo de resposta contra a criminalidade.
O período de ditadura militar foi marcado pela confirmação do serviço de policiamento ostensivo atribuído exclusivamente a Polícia Militar de Minas, contudo, também teve enorme interferência do Exército na força Polícia mineira, consubstanciada pela ideologia da segurança nacional. Neste diapasão, o consultor legislativo Fernando Carlos Wanderley Rocha (2014) afirma que o período em questão ficou marcado, até certo ponto, por uma relativa desmilitarização no sentido de fixa a atividade das policias militares no policiamento ostensivo:
Não é verdade que as Polícias Militares foram criadas ou militarizadas pelos governos militares, pois foram estes que as tiraram dos seus quartéis, ou seja, do seu caráter exclusivamente castrense, desmilitarizando-as, até certo ponto, ao atribuir-lhes missões de natureza civil no policiamento ostensivo. (ROCHA, 2014, p. 16)
A Polícia Militar e a Constituição de 1988
A Constituição da República Federativa do Brasil de 1988 (CRFB/88) foi à primeira das Constituições brasileiras a se preocupar com a atividade das polícias militares e definir suas funções dentro de um novo cenário de redemocratização da sociedade. Nas Constituições anteriores não havia intenção de determinar funções para as polícias militares dos Estados, ficando atribuídas as leis infraconstitucionais definirem as atribuições das policiais militares.
Destarte, o artigo 42 CRFB/88, disciplina que “os membros das polícias militares e corpos de bombeiros militares, instituições organizadas com base na hierarquia e disciplina, são militares dos Estados do Distrito Federal e dos Territórios.”
O parágrafo 5º do artigo 144 da Constituição afirma que “às polícias militares cabem a polícia ostensiva e a preservação da ordem pública”. Já o parágrafo 6º do mesmo artigo constitucional cita que as polícias militares e bombeiros militares são subordinados aos governadores dos Estados, do Distrito Federal e dos Territórios. Fica evidenciado que cabem as polícias militares a responsabilidade de policiamento ostensivo e preventivo, zelando pela manutenção da ordem pública no âmbito dos Estados e do Distrito Federal.
Já o artigo 142 da Constituição conceitua os militares das Forças Armadas (Exército, Marinha e Aeronáutica), disciplinando que elas “são instituições nacionais permanentes e regulares, organizadas com base na hierarquia e na disciplina, sob a autoridade suprema do Presidente da República, e destinam-se a defesa da pátria, à garantia dos poderes constitucionais e, por iniciativa de qualquer destes, da lei e da ordem.” Observa-se que as Forças Armadas cabem proteger a pátria e os poderes da república, ou seja, as funções destas são bem diversas do policiamento preventivo e ostensivo das Polícias Militares.
As Polícias Militares e os Corpos de Bombeiros Militares exercem a função de segurança pública e atividade de defesa civil respectivamente, mas por força do parágrafo 6º do artigo 144 da Constituição, estas instituições são forças auxiliares e reservas do Exército. Em caso de estado de emergência, de estado de sítio ou de guerra, os militares dessas corporações podem ser convocados para incorporarem ao Exército e exercerem funções diferentes das atividades de segurança pública e de defesa civil, respectivamente.
Deve-se citar também que o § 1º do artigo 42 da CRFB/88 afirma que se aplicam a todos os militares as normas constitucionais expostas no artigo 14, § 8º, que se refere à elegibilidade dos militares; no artigo 40 § 9º, referindo-se a contagem de tempo previdenciário; e no artigo 142 § 2º e 3º, que disciplina as questões da proibição de habeas corpus para punições disciplinares militares, do uso das patentes e uniformes, da proibição da sindicalização e da greve, entre outras disposições aplicadas tanto aos militares das Forças Armadas quanto aos Policiais Militares e Corpos Bombeiros Militares dos Estados e do Distrito Federal.
A Segurança Pública
Na visão do autor António Francisco de Souza (2009), segurança significa o estado daquilo que é seguro e seguro é aquilo que está livre de perigo, ou seja, protegido do perigo. Para a Constituição da República Federativa do Brasil de 1988, a segurança pública é dever do Estado, direito e responsabilidade de todos. Com este pensamento, António Francisco de Souza explica que: “A segurança pública corresponde, pois, a um estado que possibilita (viabiliza) o livre exercício dos direitos, liberdades e garantias consagrados na Constituição e na lei.” Portanto, o autor conclui que “a segurança é, simultaneamente, um bem individual e coletivo, tal como a sociedade pertence a todos e a cada um.”
Continuando na interpretação do autor António Francisco de Souza (2009), a segurança pública não é reservada apenas para a atuação das forças policiais, contudo, é também um direito fundamental do ser humano. É neste sentido, que se pode afirmar que a segurança pública tem como meio direto a organização da forças policiais e meio indireto os investimentos em políticas sociais. O autor Túlio Kahn (2002) afirma que a Constituição atribuiu a maior parcela de responsabilidade pela segurança pública aos Estados, quando coloca na esfera estadual a organização policial e carcerária (ações diretas de segurança pública), enquanto aos municípios cabem os investimentos em educação e políticas sociais (meios indiretos de segurança pública).
Princípios Constitucionais Inerentes à Polícia Militar
Princípio da Impessoalidade
Princípio expresso no caput do artigo 37 da CRFB/88 que já tem uma definição expressa neste mesmo artigo constitucional, em que no seu § 1º “proíbe que conste nome, símbolo ou imagens que caracterizem promoção pessoal de autoridades ou servidores públicos em publicidade de atos, programas, obras, serviço ou campanhas dos órgãos públicos.”
Deve-se citar também a interpretação de Maria Sylvia Zanella Di Pietro (2010) em que a “Administração não pode atuar com vistas a prejudicar ou beneficiar pessoas determinadas, uma vez que é sempre o interesse público que tem que nortear o seu comportamento.”
No primeiro coso o princípio da impessoalidade proíbe a promoção pessoal de agentes ou de autoridades públicas por meio da Administração e no segundo proíbe à possibilidade de fazer preterição entre pessoas para prejudicá-las ou beneficiá-las. Prevalece sempre o interesse público nos atos da Administração.
Para o autor MEIRELES (2012) o princípio da impessoalidade “nada mais é que o clássico princípio da finalidade, o qual impõe ao administrador público que só se pratique o ato para seu fim legal. E o fim legal é unicamente aquele que a norma de Direito indica expressa ou virtualmente como objetivo do ato, de forma impessoal.”
Princípios da Moralidade
Esse princípio também exposto no caput do artigo 37 da CRFB/88, afirma que os atos dos agentes e autoridades públicas no exercício da administração pública terão que seguir os preceitos legais, os bons costumes, as regras de boa administração e os princípios da justiça e da equidade.
Para MEIRELES (2012), “o certo é que a moralidade do ato administrativo juntamente com a sua legalidade e finalidade, além da sua adequação aos demais princípios, constituem pressupostos de validade sem os quais toda atividade pública será ilegítima.”
Na visão de DI PIETRO (2010), para “a moralidade administrativa não basta a legalidade formal, com observância da lei, mas é necessário também a observância de princípios éticos, de lealdade, de boa-fé, de regras que assegurem a boa administração e a disciplina interna na Administração Pública.”
Princípio da Publicidade
Principio também expresso no caput do artigo 37 da Constituição Federal que, conforme MEIRELES (2012), “abrange toda atuação estatal, não só sob o aspecto de divulgação oficial de seus atos como, também, de propiciação de conhecimento da conduta interna de seus agentes.”
Princípio da Eficiência
Também é princípio exposto no caput do artigo 37 da CRFB/88 que na visão de MEIRELES (2012) “exige que a atividade administrativa seja exercida com presteza, perfeição e rendimento funcional.” E o autor Hely Lopes Meireles (2012) completa afirmando que “é o mais moderno princípio da função administrativa, que já não se contenta em ser desempenhada apenas com legalidade, exigindo resultados positivos para o serviço público e satisfatório atendimento das necessidades da comunidade e de seus membros.”
Segundo DI PIETRO (2012) existe dois aspectos sobre o princípio da eficiência: um “em relação ao modo de atuação do agente público, do qual se espera melhor desempenho possível de suas atribuições, para lograr os melhores resultados;” e outro “em relação ao modo de organizar, estruturar, disciplinar, a administração pública, também com o mesmo objetivo de alcançar os melhores resultados na prestação do serviço público.”
Princípio da Razoabilidade ou da Proporcionalidade
Para Hely Lopes Meireles (2012), o princípio da razoabilidade “pode ser chamado de princípio da proibição de excesso, objetiva aferir a compatibilidade entre os meios e os fins, de modo a evitar restrições desnecessárias ou abusivas por parte da Administração Pública.”
Esse princípio é controlador da atuação da discricionariedade na administração pública, serve como medida que avalia a oportunidade e conveniência com a finalidade do ato. “Trata-se de princípio aplicado a Administração Pública como mais uma das tentativas de impor-se limitações à discricionariedade administrativa, ampliando-se o âmbito de apreciação do ato administrativo pelo Poder Judiciário” (DI PIETRO, 2010, p. 79)
Para António Francisco de Souza (2009) a razoabilidade constitui uma das mais significativas inovações do direito. “O fundamento dogmático-jurídico reside tanto no princípio do Estado de direito, como nos direitos fundamentais. A violação deste princípio conduz sempre à ilegalidade do ato ou da conduta. (SOUZA, 2009, p. 74)”
Princípio da Supremacia do Interesse Público
Segundo Hely Lopes de Meireiles (2012), “a primazia do interesse público sobre o privado é inerente à atuação estatal e domina-a, na medida em que a existência do Estado justifica-se pela busca do interesse geral, ou seja, da coletividade.” E conforme Maria Sylvia Zanella Di Pietro (2010), este princípio “inspira o legislador e vincula a autoridade administrativa em toda a sua atuação.”
Princípio da Boa-fé
Este princípio, de acordo com os comentários da autora Maria Sylvia Zanella Di Pietro (2010), não está previsto expressamente na Constituição, contudo, pode ser retirado de outros princípios constitucionais, especialmente do princípio da moralidade e da probidade administrativa. Assim a autora DI PIETRO (2010) define que “o princípio da boa-fé abrange um aspecto objetivo, que diz respeito à conduta leal, honesta, e um aspecto subjetivo, que diz respeito à crença do sujeito de que está agindo corretamente.”
Portanto, na atividade policial este princípio relata sobre a confiança que o particular tem no serviço policial. E este não induzirá o particular em erro.
Fato conhecido de violação a este princípio é o conhecido “flagrante preparado”, quando o policial induz o particular no cometimento de crime.
A Polícia Militar de Minas Gerais e a Constituição Cidadã
Neste raciocínio, compreende-se que com os novos paradigmas advindos da Constituição democrática de 1988 (conhecida como Constituição cidadã), a Polícia Militar de Minas Gerais deparou-se com uma nova visão de cidadania em que as forças policiais devem proteger os cidadãos. Foram incluídas dentro da segurança pública as funções da policia militar, sendo esta ostensiva e de preservação da ordem pública. Além das atribuições estabelecidas na constituição de forma explicita, as polícias militares devem seguir o objetivo geral da nova constituição, ou seja, polícia protetora dos princípios de direitos e garantias fundamentais da pessoa humana. Assim sendo, a CRFB/88 cita que, in verbis:
Art. 144. A segurança pública, dever do Estado, direito e responsabilidade de todos, é exercida para preservação da ordem pública e da incolumidade das pessoas e do patrimônio, através dos seguintes órgãos:....V- Polícias Militares e Corpos de Bombeiros Militares. (VADE MECUM, 2012, p. 51)
O parágrafo 5º do artigo 144 da CFRB/88 estabelece a destinação das polícias militares, afirmando que a elas cabem o policiamento ostensivo e a preservação da ordem pública; e no parágrafo 6º define que as polícias militares e corpos de bombeiros militares, forças auxiliares e reserva do Exército, subordinam-se aos governadores dos Estados, do Distrito Federal e dos Territórios. Neste sentido, o autor Pedro Lenza afirma em seu livro de Direito Constitucional que:
Apenas para explicar, devemos destacar que os militares são não só os integrantes das Forças Armadas (Marinha, Exército e Aeronáutica – art.142), como também os integrantes das Forças Auxiliares e reserva do Exército (polícias militares e corpos de bombeiros militares – art.42, caput, c/c o art. 144, § 6º). Os primeiros estão organizados em nível federal (como vimos, as Forças Armadas são instituições nacionais), enquanto os membros das polícias militares e dos corpos bombeiros militares, instituições organizadas, também, com base na hierarquia e disciplina, em nível estadual, distrital ou dos territórios. (LENZA, 2011, p. 849)
A Polícia Militar de Minas Gerais dentro do cenário da nova democratização do país tem se adequado ao modelo constitucional de polícia cidadã, conforme princípios constitucionais. Assim Francis Albert Cotta (2014) comenta esse novo modelo de policiamento estabelecido pela Polícia Militar de Minas após CRFB/88:
A PMMG procurou melhorar os seus processos e a estratégia institucional de policiamento, saindo de uma atitude mais reativa para outra pró-ativa na execução de suas atividades. Desenvolveu e buscou implantar a chamada Polícia de Resultados, implementando o sistema de geoprocessamento e os Conselhos Comunitários de Segurança Pública. Na polícia orientada para solução de problemas, os policiais utilizam as informações coletadas durante os atendimentos dos incidentes e as informações obtidas através de outras pesquisas para obter uma definição clara do problema, passando a lidar, então, com as condições até então ocultas. (COTTA, 2014, p. 233)
Com essa linha de raciocínio que o historiador define a evolução histórica da PMMG e suas transformações diante da CRFB/88:
A síntese do processo histórico e da construção das várias identidades assumidas pelos militares responsáveis pela polícia em Minas Gerais no longo período que vai do século XVIII ao XXI poderia ser resumido na expressão: de soldado a técnico em segurança pública ou, numa perspectiva alinhada com as novas perspectivas institucionais e constitucionais, a técnico de segurança do cidadão. (COTTA, 2014, p. 235)
Nesta vertente, o historiador COTTA (2014, p. 233) afirma que “dentro da concepção do policiamento comunitário a polícia passaria a colaborar para a qualidade de vida e seu papel se caracterizaria por uma abordagem ampla de solução de problemas”. Portanto, a Polícia Militar de Minas passava para uma nova fase nas relações internas (nos processos de formação) e externa (nas relações com o cidadão, que agora é o alvo da proteção da polícia).
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